sexta-feira, 20 de agosto de 2010

"Fui eleito presidente do seu coração...♫" - Roberto Carlos e a Política

Foto: Dida Sampaio / Arquivo Blog RCB
Olá, suditos!

Atendendo ao convite do meu amigo James Lima, eu, Vinícius Faustini, estou aqui tendo o privilégio de ao menos por um post ser colaborador do RCB. Espaço de tantas emoções, com tantas histórias pra contar e que se tornou um reduto no qual muitos fãs podem ver reportagens, coberturas e curiosidades sobre o artista que une tantos milhões de amigos também via Internet - ROBERTO CARLOS.

O Horário Eleitoral Gratuito começou apenas esta semana, e o primeiro turno das eleições para deputados estaduais e federais, senadores, governadores, além da eleição do novo presidente da República, só acontecerá no dia 3 de outubro. Mas, certamente, todos aqui já elegeram Roberto Carlos como presidente de seus corações. Então, é hora do Blog RCB fazer a plataforma de governo de RC, e apresentar um pouco da trajetória política que tem sua música.

"Não torço nem pelo governo, nem pela oposição. Torço pelo Vasco".

Assim Roberto Carlos se esquivou de uma pergunta sobre a situação política brasileira. Era época de abertura política, e ainda havia eleições indiretas e ausência de pluripartidarismo (os políticos se dividiam entre Arena e MDB). A resposta dele foi sua maneira irreverente de falar de questões políticas, das quais ele saía pela tangente, como foi o caso de uma entrevista à Revista do Rádio em 1965, na qual não quis falar sobre reforma agrária e sobre políticos como Charles de Gaulle e Roberto de Campos. (Foto: Faria Lima, ex-prefeito de São Paulo, e Roberto Carlos. Arquivo Blog RCB)

Em 30 de maio de 1983, Roberto explicou com mais detalhes sua conduta, numa entrevista ao jornalista Geneton Moraes Neto:

"GENETON - Como é que você recebe essas cobranças políticas que são feitas por parte de um público mais intelectualizado? Isso incomoda?

ROBERTO - Incomodar exatamente não incomoda não. Na verdade, sempre respondo que sou um cantor e é difícil, para mim, responder a certo tipo de perguntas. De repente, eu poderia estar falando de uma coisa de que eu não sei suficientemente para estar respondendo de público. Eu penso dessa forma. Mas me incomodar, não. Acho que até já me acostumei, sabe, bicho? Já estou acostumado! (ri um bocado)

GENETON - Cantor deve falar de política?

ROBERTO - Depende! Se for a dele...

GENETON - Não é a sua...

ROBERTO - Publicamente, pelo menos, não, não é (ri) Muita gente pensa que eu sou uma pessoa que não fala de política. Na verdade, eu não falo de política publicamente, porque não sei o suficiente para estar por aí falando de política diante das câmeras, microfones, jornais e coisas assim. Então, eu prefiro não falar, porque não sei o suficiente de política. Isso não quer dizer, no entanto, que eu não discuta os problemas e a situação, nas minhas conversas particulares com meus amigos".

(N.A.: trecho retirado do livro CARTAS AO PLANETA BRASIL, no qual o jornalista Geneton Moraes Neto publicou entrevistas realizadas com várias personalidades. A entrevista de Roberto Carlos é intercalada por declarações de Caetano Veloso, e a reportagem tem o título É REI!)

No entanto, Roberto apresenta em sua discografia algumas nuances políticas bem interessantes. Seja através do engajamento político ou por meio de versos irreverentes, seguem as plataformas de governo do cantor Roberto Carlos!

A data mais lembrada dentre os fãs de Roberto Carlos é de 1971. A Ditadura Militar, que se instaurara em 1964 travestida de "Revolução" vivia seus anos de chumbo desde 1968. Censura, perseguições, luta armada, tortura e um país respirando insegurança no futuro. Com o patrulhamento do governo, alguns artistas tiveram que sair do país, dentre eles Caetano Veloso.

No exílio em Londres, Caetano recebeu a visita de Roberto Carlos, que lhe apresentou uma doce "canção de exílio" assinada em parceria com Erasmo Carlos. Dos caracóis de Caetano Veloso vinha a certeza de que todo o passado sangrento do período militar seria deixado para trás no momento em que o cantor molhasse seus cabelos na água azul do mar, como dizem os versos de Debaixo dos caracóis dos seus cabelos. O fato só foi confirmado abertamente em 1992, quando Caetano Veloso revelou a história no show Circuladô. (Foto: Roberto e Caetano, durante o Roberto Carlos Especial 1975. Rede Globo)

Na bagagem, RC ainda trouxe Como dois e dois , na qual dava voz ao protesto do compositor baiano para dizer que tudo era certo "como dois e dois são cinco" e que "tudo vai mal, tudo, tudo mudou, não me iludo e contudo, a mesma porta sem trinco, o mesmo teto e a mesma lua a furar nosso zinco". Segundo o próprio Caetano, a letra enigmática ajudou Roberto Carlos a explicitar seu ponto de vista sobre a situação do país, de uma forma que não fosse "a estupidez" de tomar atitudes de uma esquerda convencional.

Entretanto, 1971 trouxe outros dois momentos de protesto musical com a coautoria de Roberto Carlos. No antológico (mas, infelizmente, não muito conhecido) LP Carlos, Erasmo, Roberto e Erasmo apresentaram canções que apontavam para a situação do país. A primeira delas foi Mundo deserto, que rendeu uma belíssima releitura de Elis Regina um tempo depois, e traz um refrão impactante e, na última estrofe, uma mensagem em relação aos que se foram vítimas do período militar:

"Num mundo deserto de almas negras
Me visto de branco
Me curvo da vida, sofrida, sentida
Que deram pra mim

Num mundo deserto de almas negras
Sorriso não nego
Mas vejo um sol cego
Querendo queimar o que resta de mim

Vivo num mundo deserto de almas negras
Vivo num mundo deserto de almas negras

Na bondade da verdade
Eu quero ficar
E não acredito no dito maldito
Que o amor já morreu

Tenho fé que o meu país
Ainda vai dar amor pro mundo
Um amor tão profundo, tão grande
Que vai reviver quem morreu"

A canção que segue tem um dado curioso. Embora tenha sido gravada por Erasmo Carlos, o irmão camarada afirmou que foi composta exclusivamente por Roberto Carlos, e Erasmo só entrou mesmo como coautor. É preciso dar um jeito, meu amigo não chega a ter o impacto musical de Mundo deserto, mas traz palavras bem impactantes para a época:

"Eu cheguei de muito longe
E a viagem foi tão longa
E na minha caminhada
Obstáculos na estrada
Mas enfim aqui estou

Mas estou envergonhado
Com as coisas que eu vi
Mas não vou ficar calado
No conforto acomodado
Como tantos por aí

É preciso dar um jeito meu amigo
É preciso dar um jeito meu amigo

Descansar não adianta
Quando a gente se levanta
Quanta coisa aconteceu

As crianças são levadas
Pela mão de gente grande
Quem me trouxe até agora
Me deixou e foi embora
Como tantos por aí

É preciso dar um jeito, meu amigo
É preciso dar um jeito, meu amigo

Descansar não adianta
Quando a gente se levanta
Quanta coisa aconteceu

É preciso dar um jeito, meu amigo
É preciso dar um jeito, meu amigo"

Não bastassem as coisas absurdas ocorridas em nome da "segurança nacional", os militares cometeram uma atrocidade: designar os discos como "bens supérfluos". Roberto Carlos chegou a gravar um depoimento para o programa dominical Fantástico em 1981, no qual declarou que "povo que canta é povo feliz". E questionou "será que a felicidade também é supérflua pra vocês?". Lamentavelmente, isto não foi ao ar na época, e só chegou aos olhos das pessoas graças a um dos DVDs dos melhores momentos do Fantástico, no qual eles mostravam entrevistas inéditas de outras grandes personalidades como Fernanda Montenegro, Jânio Quadros e Nelson Rodrigues. Veja o vídeo. (Diretos reservados à TV Globo)


Mas o Brasil sobreviveu. Aos poucos, a Ditadura Militar foi perdendo força, deu lugar a uma abertura política "gradual, lenta e segura", e o país respirou novos ares a partir de 1985. Ao final deste ano, Roberto Carlos lançou Verde e amarelo. Música ufanista, aproveitando o momento de amor pela pátria que tomou o Brasil naquele ano - os comícios e as passeatas pedindo "Diretas Já" e a frustração de o primeiro presidente civil depois de décadas, Tancredo Neves, morrer às vésperas de tomar posse.

Na época, Miéle tentou demovê-lo da ideia de lançar a canção, por achar que ela viria "fora de hora", e também pelo receio de RC sofrer o mesmo patrulhamento ideológico que a dupla Dom e Ravel, intérpretes de Eu te amo, meu Brasil e Ivan Lins, com O amor é o meu país sofreram por escreverem músicas sobre o Brasil. Roberto disse que a lançaria, pois seu público sabia que ele não levanta bandeira política em seus versos. (Foto: Roberto Carlos canta Verde e Amarelo, em show, em 1985. Arquivo Blog RCB)

Com a morte de Tancredo Neves, José Sarney tomou posse e ficou no poder entre 1985 e 1989. Durante este período, Roberto apresentou um raro momento de apoio político explícito. Não sendo conivente com determinados partidos, mas ao elogiar publicamente o governo de Sarney, que não recomendou o filme Je vous salue Marie, no qual o cineasta francês Jean Luc Godard apresentava uma versão mais controversa da história da Sagrada Família.

RC justificou seu apoio da seguinte maneira: "Não vi e não gostaria de ver. Sou contra esse tipo de filme que mexe com divindades. Acho que deve haver respeito para com a Virgem Maria. Pelo que li sobre o filme estou de acordo com o presidente Sarney sobre sua proibição". A carta de Roberto recebeu um repúdio público de Caetano Veloso, que afirmou que esta atitude envergonhava a classe musical e que a proibição ao filme era uma violência cultural e uma vergonha política. Caetano ainda disse: "Para compensar a burrice de Roberto Carlos, vamos manter uma atitude de repúdio ao veto e de desprezo aos hipócritas e pusilânimes que o apoiam".

Roberto Carlos teve sua tréplica, mas deixou explicitamente os motivos pelos quais apoiou o veto a Je vous salue Marie: "Caetano foi muito deselegante. Apoiei o veto por absoluta consciência de que o filme de Godard deturpa e desrespeita a história sagrada. Continuo contra a sua exibição porque sou um homem religioso e os valores cristãos são muito importantes para mim".

Talvez por causa do desgaste que teve no episódio com Caetano Veloso, o cantor tenha apoiado publicamente apenas dois candidatos. Em 1986, Roberto Carlos apoiou a candidatura de Antônio Ermírio de Moraes a governador do estado de São Paulo, chegando a estar com o empresário em alguns comícios. A eleição foi vencida por Orestes Quércia. Quatro anos depois, RC apoiou o jurista José Saulo Ramos na sua candidatura a deputado federal, mas apenas ao posar nas fotos com ele. Saulo, que é seu advogado, havia sido ministro da Justiça no governo José Sarney, entre 1989 e 1990. (Imagem: RC e Antonio Ermírio de Moraes. Gentilmente cedido por Fabiano Cavalcante)

Por dois momentos, Roberto teve contato com presidentes do Brasil. Em 1990, na parte vespertina de seu especial Verde é vida, o então presidente Fernando Collor de Mello fez um pronunciamento sobre o meio ambiente. No ano de 2002, uma das melhores medidas tomadas por Fernando Henrique Cardoso foi condecorar o cantor por seus "préstimos à cultura nacional". (Foto: Roberto Carlos sendo condecorado com a Ordem do Mérito Cultural. Lula Marques)

Mas a tendência de RC sempre foi deixar o amor falar mais alto. Em vez de falar dos vários problemas políticos, ele vinha com o amor, que era a solução para todos os males do país. E o romantismo também passou pela vertente política da obra de Roberto Carlos por dois momentos.

O primeiro é de 1986. No LP Abra seus olhos, Erasmo Carlos cantou uma música da dupla na qual os dois trazem os argumentos de um homem que pede para receber o voto do coração da mulher. Canção não muito lembrada da safra da dupla, O resto é blá-blá-blá traz uma bem-humorada declaração amorosa, que brinca com medidas de um governante. Você pode ouvir esta música clicando no PLAY:

O Resto É Blá-Blá-Blá
Roberto Carlos - Erasmo Carlos / PolyGram / Amigos (Sony Music) / Ecra (AbrilMusicPub)


"Se eu for seu eleito
Vou fazer reforma agrária no seu coração
Cada um de mim
Vai morar em uma parte do seu peito

Compulsório sobre o meu amor
Eu prometo que jamais irei cobrar
Reajuste em nossas relações
Por segundo você vai ganhar

O resto é blá-blá-blá...

Se eu for seu eleito
Certamente não vou congelar seu jeito
Nem cobrar imposto
Por seu rosto, que eu acho tão perfeito

Vou inaugurar um jogo aberto
Respeitar os seus direitos de mulher
Meu mandato vai durar pra sempre
Pelo tempo que você quiser

O resto é blá-blá-blá...

Por favor, diga que sim
Não se esqueça de votar em mim...".

Em 1991, seria Roberto Carlos a brincar com o protocolo político. No ápice do governo Collor, RC elegia sua amada como "primeira dama". Derramando amor, ele fazia uma homenagem à mulher que o elegeu presidente do coração dela. E o Blog RCB traz a canção pra você ouvir.

Primeira Dama
Roberto Carlos - Erasmo Carlos / CBS Sony Music BMG / Amigos (Sony Music) / Ecra (AbrilMusicPub)


"No palácio do meu quarto só o amor domina
Quando a sós aqui entre nós a noite não termina
E eu que sou como qualquer homem na rua
Sou o dono do país e a culpa é sua
Foi você quem me escolheu
Pra governar o nosso estado de emoções

Fui eleito presidente do seu coração
E na posse discursei frases de amor, de sonho e de paixão
Me esqueci do protocolo e nos meus braços
Te beijei à luz da lei de quem se ama
E como todo apaixonado eu te declaro então
Minha primeira dama

Primeira dama da minha vida, meu grande amor
Da nossa casa, pequeno mundo de um sonhador
Eu sou alguém que você tem e que te ama
E sendo assim você é minha primeira dama"

Diante de uma trajetória tão intensa com a política, é pouco provável que RC não seja eleito o maior cantor popular do país. E você, vota nele?

Obrigado ao James pelo espaço e a toda a equipe do Blog RCB, por todo o carinho de sempre. É sempre bom passar por aqui,

Vinícius Faustini

Próxima Matéria
Próxima sexta-feira estaremos de volta, para falar, enfim, sobre a canção Coisa Bonita, com fotos, vídeos, a música, e curiosidades que, na certa, você ainda não sabe.
Compre CDs e DVDs de Roberto Carlos !

2 comentários. Clique aqui para comentar!:

alda disse...

claro meu rei voce sempre sera eleito do meu coraçao

Carlos André disse...

Rapaz,mandou bem nesse visual do blog sobre a jovem guarda hein??

Abraços
Carlos André